Material trabalhado no curso - Praticas de linguagem - Alfredina Nery
Avaliação
de leitura (itens de múltipla escolha)
Com o objetivo de realizar uma avaliação de leitura, a
proposta é que os alunos, individualmente, e, por escrito, façam uma avaliação
de múltipla escolha. Para isto, leem, autonomamente, o texto (que já foi objeto
de uma Sequência Didática, por exemplo) e ao lerem os itens, assinalam, em cada
um, a alternativa que considerarem correta.
Texto selecionado
O
ratinho, o gato e o galo
Certa manhã um ratinho saiu do
buraco pela primeira vez. Queria conhecer o mundo e travar relações com tanta
coisa bonita de que falavam seus amigos.
Admirou a
luz do sol, o verdor das árvores, a correnteza dos ribeirões, a habitação dos
homens. E acabou penetrando no quintal duma casa da roça.
— Sim senhor! É interessante
isto!
Examinou tudo minuciosamente,
farejou a tulha de milhão e a estrebaria. Em seguida notou no terreiro um certo
animal de belo pêlo que dormia sossegado ao sol. Aproximou-se dele e farejou-o
sem receio nenhum.
Nisto aparece um galo, que
bate as asas e canta.
O ratinho por um triz não
morreu de susto. Arrepiou-se todo e disparou como um raio para a toca. Lá
contou à mamãe as aventuras do passeio.
— Observei muita coisa
interessante — disse ele— mas nada me impressionou tanto como dois animais que
vi no terreiro. Um, de pêlo macio e ar bondoso, seduziu-me logo. Devia ser um
desses bons amigos da nossa gente e lamentei que estivesse a dormir,
impedindo-me assim de cumprimentá-lo. O outro... Ai, que ainda me bate o
coração! O outro era um bicho feroz, de penas amarelas, bico pontudo, crista
vermelha e aspecto ameaçador. Bateu as asas barulhentamente, abriu o bico e
soltou um có-ri-có-có tamanho que quase cai de costas. Fugi. Fugi com quantas
pernas tinha, percebendo que devia ser o famoso gato que tamanha destruição faz
no nosso povo.
A mamãe-rata assustou-se e
disse:
— Como te
enganas, meu filho! O bicho de pêlo macio e ar bondoso é que é o terrível gato.
O outro, barulhento e espaventado, de olhar feroz e crista rubra, o outro,
filhinho, é o galo, uma ave que nunca fez mal nenhum.
As
aparências enganam. Aproveita, pois, a lição e fica sabendo que —
Quem vê cara não vê coração.
(LOBATO,
Monteiro. Obra infantil completa.
Volume "Fábulas". São Paulo: Brasiliense)
Leia a fábula e,
para analisá-la, assinale apenas uma alternativa em cada item.
1. O ratinho saiu
da sua casa para
a) conhecer o mundo e todos os animais,
inclusive o gato e o galo.
b) conhecer o mundo, saber se comportar e
voltar mais corajoso.
c) saber quem é amigo e quem não é, em
qualquer ocasião.
d) conhecer o mundo e travar relações com as
coisas bonitas.
Conversa com o professor
Habilidade/ Descritor: Localizar informações explícitas em um
texto. (D 1)
Resposta: d
Comentário: ler é um ato complexo que articula processos cognitivos
que nem sempre nos damos conta deles.
Ao ler,
·
fazemos antecipações, sobre
o que vamos ler, a partir de elementos paratextuais, como título, epígrafes,
prefácios, sumários, imagens, saliências gráficas e ainda antecipações sobre
o autor, o gênero textual, o suporte textual, o tema ;
·
recuperamos informações que
estão explicitas, quando fazemos reconhecimento literal de partes do
texto(“ler nas linhas”);
·
inferimos informações
pressupostas ou subentendidas, quando integramos partes do texto que estão
relacionadas (“ler nas entrelinhas”) ;
·
avaliamos o que lemos,
quando compreendendo globalmente o texto, fazemos julgamento sobre o lido
(“ler por trás das linhas”).
No caso do item, a
informação está explícita, porque o leitor localiza a resposta no próprio
corpo do texto, logo no começo: “conhecer o mundo e travar relações com tanta
coisa bonita”), pois parte dela foi
transcrita na alternativa correta. Dados de avaliação sistêmica sinalizam que
a recuperação da informação explícita é mais difícil de ser percebida, quando
a informação solicitada está no meio ou no final do parágrafo ou do texto em
questão. E ainda, quando há o uso de sinonímia entre o texto analisado e a
construção do item, pois o desconhecimento do léxico em questão pode também
dificultar a recuperação da informação explícita. Assim, há uma certa
gradação de dificuldade neste descritor que necessita ser tratada,
intencionalmente, nas práticas cotidianas de leitura.
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2. Ao encontrar o
gato dormindo, o ratinho
a) nem ligou para a aparência do gato.
b) quis fugir para conhecer o mundo.
c) gostou do belo pelo do gato.
d) arrepiou-se todo e saiu correndo.
Conversa com o professor
Habilidade/ Descritor: Identificar o conflito gerador do
enredo e os elementos que constroem a narrativa (sequência lógico-temporal
dos fatos narrados) (D 7)
Resposta: c
Comentário: esta habilidade exige que o leitor compreenda a fábula como
uma sucessão de episódios cujo eixo se dá no tempo da narrativa. É esta
habilidade que possibilita o resumo do texto, ou seja, recuperar a progressão
dos episódios que se dá ao longo do desenvolvimento do enredo que compreende:
situação inicial, desenvolvimento da
ação, conflito e situação final.
No item, o leitor precisa saber qual é uma das sequências da
história. Assim, após encontrar o gato, o ratinho fez todo seu julgamento a
respeito do felino, considerando apenas suas características aparentes,
segundo o ratinho.
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3. Quando o ratinho
descreve o gato para a mãe, percebe-se que
o gato não o assusta. Isto acontece porque o ratinho
a) é corajoso em
qualquer situação da sua vida.
b) é um otimista
quando quer fazer amizade.
c) acredita que um
animal de pelo macio e ar bondoso é amigo.
d) acredita
que um animal de bico pontudo e crista
vermelha pode ser amigo.
Conversa com o professor
Habilidade/ Descritor: Distinguir um fato da opinião
relativa a esse fato. (D 11)
Resposta: C
Comentário: todo e qualquer texto
é lugar de várias vozes, que constituem os fios que tecem o texto, como
discurso. Nesta direção, a habilidade de distinguir um fato de uma
opinião sobre ele ( expressa pelo autor, pelo narrador ou por um personagem
quando comentam o fato) contribui decisivamente para a compreensão global do
texto.
No caso do item, para
entender a reação do ratinho de gostar do gato e ter medo do galo, o leitor
precisa identificar que há um fato na lógica da fábula, que é “gato é inimigo
de rato”. No entanto, a opinião do ratinho a este respeito está invertida:
gosta do gato e tem medo do galo.
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4. Nas linhas 15,
16 e 17, o ratinho descreve o galo como
a) tendo penas
macias e ar bondoso.
b) tendo penas
amarelas e miado feroz.
c) sendo barulhento
e assustador.
d) sendo barulhento
e de olhar meigo.
Conversa com o professor
Habilidade/ Descritor: Identifica o conflito gerador e os
elementos que constroem a narrativa (características de personagens ou
ambiente) (D 7)
Resposta: c
Comentário: É importante que o leitor reflita sobre as escolhas do autor,
no que se refere às descrições de suas personagens e as relações que estabelecem
entre si no desenrolar do enredo. O ambiente é outro elemento caracterizador
da narrativa que contribui para criar o clima dos episódios narrados.
No item, na descrição do
galo, feita pelo ratinho, há escolhas semânticas que enfatizam a opinião dele
sobre o galináceo, como sendo um
inimigo: “”bicho feroz”, “bico pontudo”, “crista vermelha” (cor forte),
“aspecto ameaçador”, “bateu as asas barulhentamente”, “soltou um có-ri-co-có
tamanho”.
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5.Nas linhas 15, 16
e 17, a palavra “tamanho” poderia ser substituída por
a) muito alto.
b ) muito esperto.
c) muito feliz.
d) muito baixo.
Conversa com o professor
Habilidade/ Descritor: Inferir o sentido de um palavra ou
expressão ) (D3)
Resposta: a
Comentário: os usos de palavras ou
expressões não muito conhecidas do leitor podem representar um problema para
ele compreender um texto. A consulta ao dicionário é uma prática que não
somente precisa ser ensinada e praticada, como é necessário problematizar
seus usos, no sentido de que não é produtivo consultá-lo, toda vez que há uma
palavra desconhecida do leitor, porque isto pode comprometer, sobremaneira, a
fluência da leitura. Assim, a prática de inferir os sentidos de uma palavra
pelo contexto é uma ferramenta importante para a compreensão leitora. Cuidar,
então, da questão dos usos lexicais deixa de ser um mero exercício para
“aumentar o vocabulário do aluno”. Outro aspecto a ressaltar diz respeito ao
fato de que na produção textual no momento da revisão textual, há uma
excelente oportunidade de o estudante refletir sobre as palavras/ expressões
que melhor se encaixam no texto, dependendo de sua intencionalidade como
autor.
No item, a palavra” tamanho” significando “o canto
muito alto do galo” pode ser mesmo de pouco conhecimento dos leitores menos
experientes, tendo em vista, o autor,
seu estilo e sua linguagem, bem como as variações linguísticas relativas à
outra época histórica.
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5. Na linha 15, o trecho “O outro... Ai, que
ainda me bate o coração!” há o uso das reticências e do ponto de exclamação que
mostram que o ratinho
a) informa à sua mãe seu medo do galo.
b) emociona-se ao contar para a mãe sobre o
galo.
c) pergunta à mãe se o coração dele está
batendo.
d) declara que tem uma doença no coração.
Conversa com o professor
Habilidade/ Descritor: Identificar o efeito de sentido
decorrente da pontuação e de outras notações (D 14)
Resposta: b
Comentário: um
falante da língua, ao expressar-se oralmente, dá à sua fala um tom de voz que
seja coerente com sua intencionalidade. Na escrita, isso é conseguido também
por meio da pontuação. Um texto sem pontuação ou com pontuação não
convencional torna a leitura mais difícil. De maneira geral, podemos dizer
que o ponto de exclamação e as reticências têm um uso mais livre, a depender
da intenção do autor. Os demais sinais de pontuação — ponto, ponto-e-vírgula,
vírgula, dois-pontos, ponto de interrogação—estão mais presos às determinadas
regras que lhe são peculiares. É bom problematizar a ideia de que tratar a
pontuação de um texto vai além de meramente definir e classificar os “sinais
de pontuação”, na direção de enfatizar seus usos na construção dos sentidos
de um texto.
No item, o aluno deve
compreender que as reticências, o ponto de exclamação e o uso da interjeição
“Ai” se complementam, na direção de demonstrar as emoções do ratinho, ao
contar para a mãe seu encontro com o galo que lhe deu tanto medo.
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7. O ratinho
enganou-se em relação ao gato e ao galo porque
a) confiou apenas na aparência dos animais.
b) era muito ingênuo e amigo de todos.
c) não quis ouvir os conselhos da mãe.
d) todo jovem se engana na vida.
Conversa com o professor
Habilidade/ Descritor: Inferir uma informação implícita em
um texto (D 4)
Resposta: a
Comentário: Para inferir “ informações implícitas”, o leitor precisa “ler
nas entrelinhas”, já em um movimento de
compreender globalmente o texto. Neste sentido, as práticas de leitura
na escola podem contribuir muito para a compreensão leitora dos estudantes,
quando há perguntas mediadoras que
orientem o olhar dos leitores em formação para compreenderem os implícitos dos textos, de modo a
favorecer o desenvolvimento de capacidades de leitura mais complexas ou,
inferenciais.
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Na atividade inferencial, costumamos acrescentar ou
eliminar; generalizar ou reordenar; substituir ou extrapolar informações.
Isto porque avaliamos, generalizamos, comparamos, associamos, reconstruímos,
particularizamos informações e assim por diante. Pois inferir é produzir
informações novas a partir de informações prévias, sejam elas textuais ou
não. A única coisa que deve ser controlada na inferenciação é a falsidade ou
a incompatibilidade do resultado com os elementos explícitos do texto.
MARCUSCHI, L. A.
Compreensão de texto: algumas reflexões. In. DIONISIO, A. P. & BEZERRA, M. A. (orgs.) O livro didático de Português: múltiplos olhares. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lucerna,
2003.
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8. Na linha 17, a
expressão do texto “quase cai de costas” tem sentido
semelhante a:
a) Quase machuquei as costas.
b) Cai de costas na corrida.
c) Levei o maior susto.
d) Fui pego pelas costas.
Habilidade/ Descritor:
Inferir o sentido de um palavra ou expressão ) (D3)
Resposta: c
Comentário: já comentado no item
5.
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9. Na linha 11, a
palavra “ Lá” refere-se à
a) toca do ratinho e sua mãe.
b) casa onde viviam o gato e o galo.
c) casa do gato.
d) casa do galo.
Conversa com o professor
Habilidade/Descritor: Estabelecer relações
lógico-discursivas presentes no texto, marcadas por conjunções, advérbios etc
( coesão textual com advérbio) (D 7)
Resposta: a
Comentário: A coesão textual é um
importante conhecimento na compreensão leitora, pois determinados operadores
da língua são responsáveis pelas articulações/nexos das partes do texto. O
processo de leitura mais a revisão textual no processo de escrever são
excelentes oportunidades de os estudantes fazerem reflexões sobre as práticas de linguagem.
Verificar que aprender o uso do advérbio, como conector, é bem diferente da
aprendizagem da definição e lista classificatória ( ou seja, “ advérbio é a
palavra que modifica o verbo. Os advérbios se dividem em: adv. de negação, de
dúvida, de tempo, de lugar” etc), como
aprendemos na escola tradicionalmente.
No item, o leitor precisa compreender que a palavra “Lá”
substitui o referente de lugar, anteriormente citado: “a toca”, ou seja, a
casa do ratinho e sua mãe.
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10. A frase “Quem vê cara, não vê coração” é
a) a fala do ratinho.
b) a moral da fábula.
c) a fala da
mãe do ratinho.
d) o início da fábula.
Conversa com o professor
Habilidade/ Descritor: Identificar o conflito gerador e os
elementos que constroem a narrativa (D 6) + Identificar o tema de um
texto. (D 7)
Resposta: b
Comentário: A fábula possui vários elementos que a caracterizam: o
desenvolvimento do enredo (situação inicial, desenvolvimento da ação, conflito, situação final); as personagens
que representam “tipos humanos”, como o avarento, o ingênuo, o medroso, o
corajoso, o ciumento etc); e a moral. Esta tem, neste gênero, sua saliência,
pois através dela, o narrador expressa um ensinamento ao leitor ou ouvinte.
Em geral, a moral está separada graficamente do corpo da narrativa, por isto
pode aparecer também com outro tipo de letra ( no nosso caso, ela está
escrita em itálico).
No item 2, o que é
solicitado diz respeito ao tema da fábula, ou seja, as pessoas podem se
enganar se considerarem apenas as aparências. O tema é tratado na comparação
entre dois elementos (o gato e o galo), um representando o bem e o outro, o
mal, na direção de uma compreensão de mundo redutora ou maniqueísta, por
parte do ratinho (o personagem menos experiente). No entanto, a fala da mãe
acaba por problematizar este aspecto, quando ressalta que o filho precisa
considerar que é necessário se compreender a vida, para além das aparências,
tema caro a vários filósofos e escritores, como Machado de Assis, que tratam
das eternas relações entre “ser e aparecer ser”. Porém, problematizando um
pouco mais, pode-se compreender que Lobato acaba por colocar na “boca da mãe”
a “verdade da vida”, o que de novo, pode ser simplificador, se entendermos
que a equação se fecha assim: o menos experiente (o ratinho, o filho) sabe
menos. O mais experiente (a mãe, o adulto) sabe mais. Enfim a literatura nos
põe em movimento, na direção da complexidade da vida.
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